O dinheiro compra mesmo tudo? Conceituação de recursos no novo sistema
09 Jun 2022
Este artigo é parte de uma série de artigos sobre a questão de conceituação de recursos na sociedade civil e por que ela precisa ser repensada – especificamente em termos de uma maior valorização dos bens “intangíveis” da sociedade civil. Veja algumas outras publicações relacionadas: Rethinking civil society resourcing e Moving from the old to the new: Why it’s time to rethink civil society resourcing.
Quando pensamos em capital ou recursos (vou usar esses termos de forma intercambiável), pensamos automaticamente em dinheiro, finanças, disponibilidade de caixa, recursos monetários. Sim, sem dúvida esse é um tipo de recurso. Mas será ele o único tipo de recurso capaz de viabilizar as coisas – levar água potável a uma comunidade, montar uma rede de postos de saúde, instalar um sistema de gestão de resíduos em um bairro urbano?
Pensemos um pouco sobre isso – quais são os diferentes tipos de recursos que, juntos, realmente podem criar algo de valor para uma comunidade, algo que mude as vidas das pessoas da comunidade?
Todo sistema – seja uma vila, uma escola, um grupo de autoajuda, uma equipe de futebol local –costuma funcionar utilizando vários tipos de recursos. E diversos elementos de cada um desses sistemas trazem consigo vários tipos de recursos para viabilizar o funcionamento dos sistemas. Os indivíduos que compõem a vila ou a equipe de futebol podem contribuir tempo, talento e experiência – capital humano e intelectual. As comunidades tendem a ter em comum a sua história, valores, comprometimento, mão de obra, relacionamentos e redes – capital social e cultural. As instituições, como o conselho da vila, a secretaria de educação local, o departamento de água e saneamento, contam com equipamentos, edificações, infraestrutura E as suas respectivas propostas de liderança – capital social, político e físico. Em qualquer sistema, se procurarmos, descobriremos uma ampla gama de recursos, que integram o “grupo de recursos”, mas que nem sempre estão totalmente visíveis.
Além disso, ao avaliar qualquer sistema, podemos considerar o fato de que ele tem tanto uma necessidade quanto fontes de diversos tipos de capital.
Então, se fôssemos substituir a imagem que nos vem à cabeça de um único pote de dinheiro e passar a enxergá-lo como uma torta com várias fatias, que cara teria a nossa “torta de recursos”? Vale lembrar que todas as fatias tornam aquela torta redonda. A torta ficaria incompleta sem uma das fatias. Portanto, ter apenas uma fatia de capital financeiro nunca será suficiente para instituir a mudança que necessitamos.
Ao criar um novo sistema, pode ser interessante pensar com a cabeça de quem vive no novo sistema. O que eu quero dizer é que pode não ser possível criar o sistema que queremos se insistirmos no pensamento do sistema antigo, onde, por exemplo, o capital financeiro era o único recurso existente. Pode ser preciso transformar a imagem do pote de dinheiro único em uma torta, com várias fatias.
Quando pensamos com a lógica do novo sistema, a torta abre diante de nós a paleta de recursos mais ampla que existe como parte de qualquer sistema.
A oportunidade que temos aqui, com a lógica do novo sistema, é a de começar a influenciar e negociar novas formas de valorização, colaboração, parceria fundamentada no respeito mútuo, dignidade, integridade e uma redistribuição de poder – a verdadeira base da colaboração. Ela também pode guardar a chave capaz de nos unir (isto é, os polos de oferta e demanda atuais do sistema) para criarmos juntos estratégias integradas de levantamento de recursos – estratégias para substituir o pote único pela torta composta de várias fatias, enquanto promovemos mudanças.
Nesse processo, podemos descobrir o que cada um tem para oferecer e como devemos efetivamente começar a negociar o caminho futuro, com formas de pensar e atuar novas e repaginadas, coletivas e coesas.
Tara Rao: Trabalhando com desenvolvimento, direitos humanos e clima em âmbito mundial há mais de trinta anos, Tara orgulha-se de viver a vida como agente de transformação de sistemas, atendendo a diversas comunidades. Ela iniciou sua vida profissional como arquiteta e agora combina suas habilidades e experiências em estimulantes ações no campo, tal como #ShiftThePower.
Tradução cortesia da Rede de Filantropia para a Justiça Social.